A situação financeira da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), responsável pelos cursos de pós-graduação stricto sensu (mestrado, doutorado e pós-doutorado) do país, tem preocupado representantes de órgãos de pesquisa após significativos bloqueios orçamentários ordenados pelo governo Lula.
Apenas em agosto, foram contingenciados R$ 86 milhões da entidade, que é uma das principais fomentadoras de pesquisa no Brasil.
Contexto: No final do governo Bolsonaro, o órgão enfrentou uma crise depois de sucessivos congelamentos de recursos, que chegaram a prejudicar não só o pagamento das bolsas destinadas aos alunos, mas também a manutenção administrativa da entidade. Ao assumir a Presidência da República, Lula prometeu mais recursos para o setor e aumentou o valor das bolsas após dez anos sem reajuste.
Segundo Mercedes Bustamante, presidente da Capes, o órgão sofreu:
um bloqueio de R$ 86 milhões no orçamento de agosto;
um corte (ou seja, um bloqueio definitivo) de R$ 50 milhões neste ano;
um provável déficit de R$ 200 milhões na verba prevista para 2024.
— O que me preocupa é que o contingenciamento pode ser o primeiro passo para algo mais crítico —, afirmou Bustamante, durante audiência organizada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) em 9 de outubro.
O Ministério da Educação (MEC), responsável pela execução orçamentária da Capes, afirma que a verba de 2023 é quase R$ 2 bilhões (54,6%) mais alta do que a do ano anterior. Declara também que:
os bloqueios não são definitivos, "com possibilidade de recomposição até o final do ano fiscal";
o corte de R$ 50 milhões representa 0,92% da verba discricionária do órgão (aquela parte que não é obrigatória e que exclui os salários dos funcionários - como custos com bolsas de estudo e equipes de limpeza e segurança).
A reportagem entrou em contato também com a própria Capes, para saber se há risco de congelamento ou atraso no pagamento de bolsas de pesquisa, mas não havia recebido retorno até a última atualização deste texto.
Em fevereiro, o governo Lula havia reajustado os valores dos benefícios pela primeira vez desde 2013:
Mestrado: de R$ 1.500 para R$ 2.100 (alta de 40%)
Doutorado: de R$ 2.200 para R$ 3.100 (40%)
Pós-doutorado: de R$ 4.100 para R$ 5.200 (25%)
Formação de mestres e doutores pode ser prejudicada
Em carta aberta, o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop), que representa 273 instituições de ensino, afirma que acompanha os bloqueios com "profunda consternação".
— Não é possível conciliar um sistema que cresce e oferece cursos de qualidade com um orçamento que constantemente diminui —, diz o documento.
— Os recentes bloqueios/cortes impactam diretamente a qualidade da formação de mestres e doutores, prejudicando assim a produção de conhecimento científico e a capacidade das instituições [...] de competirem internacionalmente no campo da pesquisa e da inovação.
Segundo o Foprop, as reduções orçamentárias dificultam a retomada de iniciativas como o Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) e o Pró-Equipamentos (voltado para a melhoria da estrutura de pesquisa científica e tecnológica). Também cria obstáculos para que a Capes dê conta de 300 novos cursos/programas que entrarão no sistema nacional de pós-graduação em 2024.
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