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“O valor não importa, mas sim o caráter e a moral”, diz reciclador que devolveu R$ 8,7 mil ao dono

@ Matheus Moraes /Diário da Manhã


A quarta-feira (31) seguia normalmente para Verenice Salete Fioresi, que trabalha com sucatas junto da família no interior de Marau, até que sentiu um volume diferente no papel que estava na prensa para reciclagem, no galpão da sua propriedade, em Gruta do Rio Marau, por volta do meio-dia. A curiosidade fez com que ela abrisse o envelope e se deparasse com uma quantia de R$ 8,7 mil. Surpresa e sem reação, ela aguardou o marido, Ivan Mingotti, para contar o que havia acontecido. “Foi uma surpresa, algo inesperado. Esperei ele chegar porque não estava acreditando”, declara.

O pensamento, logo de imediato, foi de devolver a quantia para o dono. O dinheiro estava enrolado em um papel de uma empresa de Marau. “Na hora, não veio outra ideia se não a de devolver imediatamente. Como tinha o contato especificado, assim que o Ivan chegou, entramos em contato”, completa a esposa, que garante nunca ter passado por uma situação como essa nos 11 anos de trabalho com material reciclável.


O recurso pedido pela empresa e encontrado pela família equivale a arrecadação bruta de papel e outros materiais da família por três meses, sem contar com as despesas. Atualmente, a cada mês, a família consegue arrecadar oito toneladas mensais. Independente do valor, a atitude seria a mesma, garante Ivan Mingotti, também conhecido em Marau por “Alemão da sucata”. “O valor não importa, mas sim o caráter, a moral da pessoa. Quando minha esposa me contou e me mostrou, já pensamos em devolver. O primeiro pensamento foi entregar ao dono”, declara o reciclador.


O ato de honestidade acabou registrado por Mingotti por meio de um vídeo que foi publicado nas redes sociais, o qual seu filho, Ruan Mingotti, de 14 anos, mostra todas as notas de R$ 10, 20, 50 e 100. Em poucas horas, a ação repercutiu em Marau, Vila Maria, Casca, Passo Fundo e transcendeu a região Norte do Rio Grande do Sul. Segundo Mingotti, a família geralmente publica imagens da plantação de milho e da pastagem das vacas na propriedade em que trabalham em paralelo. “A gente tem mania de plantar e postar uma foto. E postamos o vídeo com o dinheiro. Não imaginávamos que fosse chegar a esse ponto. Tem tantas mensagens no telefone que não vamos conseguir ler tão cedo”, pontua Mingotti. As diversas mensagens nas redes sociais, além dos acenos e das parabenizações nas ruas, impressionaram Verenice. “Para nós foi algo normal. A gente sempre faz isso quando encontramos algo que é de alguém. Do jeito que o mundo está, deveria ser algo normal, mas hoje é uma repercussão grande”, comenta.


DONO FICOU SEM REAÇÃO AO RECEBER O DINHEIRO

Na tarde de quarta-feira, ainda com a repercussão do vídeo, Ivan Mingotti se deslocou ao Centro de Marau para devolver o dinheiro. Segundo ele, um dos sócios da empresa ficou chocado ao perceber a quantia quase perdida e a boa ação da família. “A pessoa que recebeu ficou chocada. Não soube falar outra coisa se não ‘muito obrigado’. Eles ficaram contentes”, pontua. Na manhã de quinta-feira, outro sócio da empresa enviou mensagem por telefone para Ivan e disse que queria ajudá-lo. “Entre as tantas mensagens que recebi, uma era de outro sócio. Ele chegou a dizer que queria nos pagar, mas falamos que não queremos nada. Não é porque achamos dinheiro que vamos cobrar. Nós não ajudamos pensando nisso em hipótese alguma. Não queríamos tirar proveito da desgraça dos outros”, salienta. A reportagem do Diário da Manhã tentou contato com os responsáveis da empresa que recebeu o dinheiro de volta, mas não recebeu retorno até o fim desta edição.


LIÇÃO Mais do que uma mensagem de honestidade para todos, Ivan Mingotti e Verenice Fioresi deixaram uma lição para o filho, Ruan Mingotti. “A gente recebeu essa educação e procuramos passar para frente, repassando para ele. Ainda não caiu a ficha, mas ficou de lição para ele, que sempre nos ajuda nos afazeres de casa”, conta a mãe. Na quinta-feira, Ruan retornou da escola com vários cumprimentos. “Muitos tinham visto o vídeo e vieram me cumprimentar, me parabenizar. Acho que fizemos o certo. Uma coisa nobre. Não adianta a gente ficar com algo que não é nosso”, diz o estudante de 14 anos.


A ROTINA A família que localizou o dinheiro acorda todos os dias às 5h e inicia suas atividades. Ivan e Verenice fazem o café da manhã para o filho e depois o levam para a escola. Depois, tratam as vacas que possuem na propriedade e, posteriormente, se deslocam para a cidade com a caminhonete que recolhe sucatas e passam por mercados, lojas e empresas para recolher o material descartado. Por volta do meio-dia, todos retornam para casa e à tarde iniciam o processo de triagem dos materiais na propriedade. A estrutura de hoje conta com dois galpões, sendo que um ainda nem foi pago e nem está totalmente pronto. Há poucos meses, a família separava o material numa área sem teto, debaixo de sol ou chuva.

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